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NOVOS DOCUMENTOS E A LITERATURA HISTÓRICA SOBRE ITAJAÍ

É muito comum que os leitores de livros que versam sobre a história de uma cidade considerem o relato sobre a origem de um determinado lugar como algo ‘imexível’, fixo, pronto e determinado. Mas, para contrariar esses leitores e pesquisadores comodistas, vez e outra, aparecem novos documentos que obrigam aqueles que promovem a narrativa histórica a repensar muitos dos dados até então considerados inquestionáveis, assim como a refazer a própria narrativa histórica para preencher grandes lacunas até então existentes por falta de uma prova material fidedigna.

Na narrativa histórica de Itajaí não faltam exemplos de achados que mudaram a trama histórica local. Por exatamente um século era normal afirmar que ‘Itajaí não tem história conhecida’. Por volta de 1920 Marcos Konder descobriu documentos no Rio de Janeiro e Florianópolis que possibilitavam a narrativa de que Antônio de Meneses Vasconcelos de Drummond recebeu a incumbência de fundar uma colônia na região da foz do Rio Itajaí. Com esses documentos em mãos, Marcos Konder tratou de construir uma narrativa toda própria sobre a fundação de Itajaí, sua ‘Pequena pátria’.

Décadas depois dessa primeira narrativa já ter se consolidado a ponto de se tornar hegemônica e oficial, o historiador José Ferreira da Silva conseguiu documentos que provavam que as terras utilizadas por Drummond para fundar a primeira colônia na região estavam localizadas, a bem da verdade, às margens do Rio Itajaí-Mirim, no Tabuleiro, a doze quilômetros de distância da foz do Rio Itajaí. Foi o suficiente para se ter um embate intenso sobre a fundação de Itajaí que envolveu dezenas de intelectuais e ganhou muito espaço na imprensa regional por décadas. Os documentos em mãos de Marcos Konder indicavam a fundação de Itajaí por Drummond. Os documentos em mãos de José Ferreira da Silva indicavam a fundação de Itajaí em outro ponto tendo como liderança Agostinho Alves Ramos.

Sobre o processo fundacional de Itajaí eu considero que devemos continuar procurando documentos, principalmente no Arquivo Nacional, que possam esclarecer melhor as realizações de Drummond no Tabuleiro às margens do Itajaí-Mirim, bem como, a possível utilização do ‘Caminho do meio’ [hoje Estrada Geral do Rio do Meio] como um corredor logístico ligando este empreendimento à Colônia Nova Ericeira [atual Município de Porto Belo]. Se um dia forem encontrados documentos sobre a utilização mais detalhada deste caminho colonial e a ligação direta entre as colônias Nova Ericeira – São Tomaz de Vila Nova, novas narrativas históricas terão de ser construídas, tirando da foz do Rio Itajaí o protagonismo da colonização e, por consequência, da fundação de Itajaí.

Novos documentos históricos são descobertos todos os dias e, nada desabona, a ideia de gradativamente irmos preenchendo lacunas que encontramos facilmente na narrativa histórica da gênese da comunidade itajaiense. O ponto mais lacunar dessa narrativa encontramos, justamente, no tocante à fundação da Colônia São Tomaz de Vila Nova, por Drummond, às margens do Rio Itajaí-Mirim. Por outro lado, tudo indica que novos documentos chegarão às nossas mãos brevemente, devido ao processo rápido que está ocorrendo a digitalização dos acervos públicos em Florianópolis e Rio de Janeiro.

Nessa última semana de abril [ano de 2022] presenciei um evento que bem serve de exemplo para ilustrar essa postura esperançosa na descoberta de novos documentos que possam elucidar determinadas passagens históricas ainda lacunares. O colecionador Carlos Guérios comprou em leilão na cidade de São Paulo documentos originais do processo que o Estado de Santa Catarina manteve contra o diretor da Fábrica de Papel Itajahy, Victor Kleine, por suposta simpatia à Alemanha em plena Segunda Guerra Mundial. Estes documentos estavam integrando uma coleção de selos de um filatelista de São Paulo e foram doados à AAMAPI – Associação dos Amigos do Museu e Arquivo Público de Itajaí. Ao receber os documentos, seu presidente, historiador Edison d’Ávila, destacou que o Arquivo não tinha até agora um documento oficial sobre as prisões de descendentes germânicos que ocorreram durante a Grande Guerra. O que se tinha eram, tão-somente, relatos escritos e orais.