O Ocaso de uma era ou Ditadura do consenso

Uma árvore tombada em plena avenida Marcos Konder nos fornece a imagem emblemática de um governo que experimenta o seu ocaso. Mais que um governo, uma era se finda. Com o término do terceiro Governo Morastoni termina o cenário ocupado por figuras políticas do Pós-64, tempo histórico iniciado com a eleição de 1982 e a volta do pluripartidarismo. No dia primeiro de janeiro de 2025, teremos um prefeito – e muitos elementos de su

Árvore cortada na Avenida Marcos Konder em novembro de 2024

a equipe de governo – oriundo de uma geração que não sofreu o peso da botina de 64 e 68. Robison Coelho, Rubens Angioletti, Níkolas Reis, Anna Carolina Martins … eis o novo em Itajaí. Um novo completamente refém de ideologia única. Um novo que já nasceu velho, refém do extremismo de direita. Uma onda mundial, gigantesca e avassaladora que, em Itajaí, não deixou pedra sobre pedra no castelo ideológico da esquerda. Cenário de protagonismo uniforme, uníssono, que comporta discurso único e padronizado.

De certa forma estamos vivendo uma ditadura da mesma intensidade daquela que experimentamos em 64 e 68. A única diferença é que o povo está elegendo uma massa de políticos de direita e ultradireita. O povo está retirando do cenário a esquerda e suas variações ideológicas do centro à extrema. Então é uma ditadura desejada, consentida. Essa ditadura sem golpe está sendo sustentada eleitoralmente pelos erros grosseiros e reincidentes da esquerda. Tantos são esses erros que sobrou para toda a esquerda brasileira apenas um nome: Luis Inácio da Silva. O presidente, contudo, já demonstrou na última eleição que não pode mais contar apenas com o voto da esquerda e há muito namora com grupos de centro direita. Sobraram a direita e uma versão light de Lula.

Como pensador inorgânico, pacifista, democrata, comprometido com a vida de todos os seres indistintamente … nada espero do futuro imediato tendo essa gente no comando. Se Volnei Morastoni foi uma decepção política, a nova era e sua ‘juventude senil’ não tem essa potencialidade de me decepcionar. Isto porque, nada espero dessa juventude que nasceu embrulhada em ideias velhas, ultrapassadas, que está conduzindo a humanidade e nosso planeta ao desequilíbrio total e irreversível.

A ÁRVORE TOMBADA EM PLENA AVENIDA CENTRAL DE ITAJAÍ É O EMBLEMA DE UM OCASO …. nuvens negras pairam sobre o palácio símbolo do poder republicano em Itajaí.,, e, eu, temo estar falando sozinho ao pedir moderação, equilíbrio, alteridade, compaixão, fraternidade … [Magru Floriano].

Cerimônia fúnebre e mudança de comportamento

Determinadas mudanças ocorrem de maneira tão visível que qualquer pessoa pode perceber a diferença sem grande esforço. A substituição do telefone fixo pelo móvel (celular), da máquina de escrever pelo computador, o sumiço dos jornais impressos, a quantidade de carros nas ruas … são alguns dos exemplos que podemos apresentar para atestar estas mudanças que todos percebem. Contudo, nossa sociedade também está passando por muitas mudanças que não são tão visíveis assim, pelo menos aos olhos daqueles menos acostumados a parar para pensar sobre o seu processo de desenvolvimento.

Por muitos anos nos acostumamos a ler textos filosóficos e sociológicos denunciando que a modernidade trocou o ‘ser’ pelo ‘ter’, tornando o ser humano mais materialista e egoísta. Por muitos e muitos anos, notadamente com o advento do capitalismo e a sociedade industrial, a crítica do modelo ‘time is money’ tomou conta das mentalidades que visavam à desconstrução desta mesma modernidade.

Contudo, agora, o que percebemos é um movimento muito interessante onde o ‘ter’ dá lugar ao ‘ver’. Quando todos esperavam que a humanidade poderia dar um passo para trás e voltar seus valores novamente ao ‘ser’, eis que surge uma nova geração de pessoas dando um passo à frente – seria em direção ao abismo? – instituindo o império total do ‘ver’ sobre o ‘ter’ e o ‘ser’. Nesse novo arcabouço de valores comunitários o que temos é uma lógica muito parecida com a lógica anterior. Se antes tínhamos a ideia de que nada valia a pena se não gerasse valor, riqueza, dinheiro; agora, temos a ideia central de que nada vale a pensa se não gera uma imagem que possa ser compartilhada nas redes sociais ou nas diversas plataformas digitais, como é o caso do Youtube.

Um exemplo claro dessa nova mentalidade coletiva está nas cerimônias fúnebres. Cada vez menos pessoas se propõem a comparecer às cerimônias fúnebres. Não que a pessoa morta seja desprezada socialmente ou não tenha amealhado uma boa quantidade de amigos e admiradores em vida. Não! Ninguém se interessa em participar de cerimônias fúnebres porque elas, devido nossa cultura cristã de respeito aos mortos, não cria um ambiente de espetáculo mediático digital. Não é prudente e aconselhável gravar vídeos e fazer ‘selfie’ em um ambiente como a capela mortuária ou um cemitério.

Fosse no tempo antigo, a cidade parava diante do féretro de um empreendedor como Edison Villela, ocorrido em setembro de 2024. Mas, o que vimos foram algumas pessoas dando depoimentos frios e aleatórios sobre sua contribuição ao desenvolvimento da cidade de Itajaí e ao ensino superior do Estado de Santa Catarina. Depoimentos isolados, conversas isoladas, discursos isolados …. e Edison Villela passou à história. O mesmo aconteceu com sua assessora, que morreu dias antes, professora e escritora Rosa de Lourdes Vieira e Silva. Já estou ficando acostumado a ir nesses eventos e ver no local uma dezena de pessoas, geralmente aparentados e amigos muito próximos.

No mundo do ‘ver’ o ‘time is money’ foi substituído pelo ‘olha eu aqui’. Por essa nova visão de ver as coisas do mundo incorpora-se uma nova escala de valores de forma que até o dinheiro é subestimado diante da possibilidade real de se tirar uma boa foto ou gravar alguns segundos de vídeo. Podemos gastar horas e dias, viajar para outros países, gastar dinheiro para comprar algo inusitado e desejado por muitos … para simplesmente bater uma foto e anunciar nas redes sociais: ‘Olhem eu aqui!’ Nessa nova concepção de mundo Paris é apenas uma foto, assim como o carro novo, a cerimônia de casamento, o aniversário surpresa do melhor amigo … menos a cerimônia fúnebre, esta, para arrepio dos arautos do mundo do ‘ver’ ainda resiste, permanecendo no mundo do ‘ser’ e sua finitude. [Magru Floriano]

Educação à distância

LÁ NO INÍCIO

Considero que fui um dos primeiros acadêmicos de Itajaí a frequentar um curso internacional por via digital. Isso ocorreu no ano de 1998 quando cursava mestrado na FURB – Fundação Universidade Regional de Blumenau. A entidade promoveu convênio com a Lund Univerty Sweden – que mantinha o projeto experimental de ensino à distância por plataforma eletrônica intitulada ‘Universidade Virtual Latinoamericana’.  Por dois meses participei do seminário à distância ‘New Tecnologies and Pedagogical Challenges’. A principal ferramenta era o email. Recebíamos textos na nossa caixa de correspondência e tínhamos um prazo para realizar determinas tarefas. Também fazíamos discussões em grupo promovido nos ambientes do mestrado da Furb. O tema principal era justamente como estaríamos nos preparando para educar utilizando as novas ferramentas digitais.

NOS DIAS ATUAIS

O tempo passou, agora, aposentado, estou percebendo que aquilo que discutíamos em 1998 como sendo o futuro da educação já se tornou obsoleto, passado. A tecnologia avançou muito mais rápido e de forma muito mais intensa do que podíamos prever naquele momento. Nesse período – 1998 a 2014 – ocorreu uma verdadeira tempestade tecnologia na educação. Para ter uma base de referência dessa mudança basta promover uma rápida visita à escola piloto que o SESI montou em Itajaí. Os alunos estão sendo envolvidos por um projeto pedagógico que visa, sobretudo, a inserção no mercado de trabalho – filosofia que está na essência do sistema educacional Sesi. Ali, vi poucas salas de aula e muitos laboratórios de informática. Os alunos constroem robôs, trabalham com impressoras 3D e, frequentam alunas intensivas de programação digital.

Bem, voltando à minha experiência pessoal, eu adquiri pela Internet em 2023 um curso intitulado Chessflix onde, simplesmente, passei a ter aulas em casa com diversos grandes mestres de xadrez brasileiros: Evandro Barbosa, Luiz Paulo Supi, Júlia Alboredo e Henrique Mecking. Antes da Internet, para ter aulas nesse nível teria de me deslocar semanalmente para Curitiba ou São Paulo, pagar hotel, ter agenda mais flexível durante toda a semana, sem falar no alto custo da logística e do próprio curso. Agora, fico na minha casa podendo economizar com transporte, hotel, alimentação fora de casa; escolho horário, quantidade de horas estudadas, nível de aprendizado; posso repetir quantas vezes considerar necessário uma determinada aula …

Em agosto de 2024 resolvi comprar pela Internet um curso de filosofia. Ao preço de duzentos reais, estou frequentando pela plataforma HotMart o curso ‘Demasiado humano’ sobre as ideias do filósofo Friedrich Nietzsche. Só a primeira aula introdutória vale um seminário presencial inteiro que poderia frequentar nos grandes centros do Brasil ao custo de milhares de reais, considerando inscrição, transporte, hotel, alimentação …

DIGITAL VERSUS PRESENCIAL

Aqui cabe uma ressalva: é claro que eu estou disposto a conhecer pessoalmente toda essa gente que está na Internet me dando aula. Se essas pessoas estiverem por perto, vou atrás delas, ouvi-las pessoalmente, conhece-las em carne e osso, apertar suas mãos e dizer simplesmente – Parabéns, mestres! [Magru Floriano]

Tecnologia da educação: aprendendo xadrez sem sair de casa

Há muito que temos boa parte do conhecimento produzido pela humanidade na ponta de nossos dedos através dos dispositivos eletrônicos que nos oferece a Era Digital. Muitos desses mecanismos nos levaram, em um primeiro momento, pensar que a grande conquista a ser alcançada no setor educacional seria tão-somente o ‘ensino à distância’ em tempo real na comunicação educador-educando. Mas, agora em 2024, percebemos que a tecnologia nos levou muito além. Tudo, absolutamente tudo, está à nossa disposição em qualquer lugar e hora. Podemos aproveitar o tempo perdido na sala de espera de um consultório médico para estudar sobre um determinado assunto ou acompanhar os últimos acontecimentos mundiais via sites noticiosos. O conhecimento está disponível, em tempo real, seja qual for o local ou circunstância que a pessoa esteja envolvida. Eis a grande revolução.

No final de 2023 eu adquiri um ‘Curso de xadrez’ pela plataforma ‘Chessflix’ passando a aprofundar minha base de conhecimento sobre o jogo de xadrez em casa, contando com o apoio de diversos Grandes Mestres, alguns GM Internacionais. Ter aula em casa com enxadristas graduados como Evandro Barbosa, Luis Paulo Supi, Roberto Molina, Júlia Alboredo … é algo inacreditável. Primeiro, porque o custo de um curso presencial individual com um desses mestres deveria ter um preço quase que inacessível; segundo porque eu posso escolher onde e quando vou estudar; terceiro, posso refazer quantas vezes quiser a aula sem qualquer custo adicional e sem perda de qualidade; quarto, posso parar a transmissão da aula para promover, com calma, minhas anotações de aprendizado; quinto, tenho a opção de estudar por níveis diferenciados de conhecimento, facilidade didática extraordinária que auxilia em todo o processo de aprendizagem. Você pode escolher ‘Partindo do zero’ e ir subindo de categoria até chegar ao nível ‘A trilha dos 2000+’.

A verdade é que eu estou em minha casa estudando com os GMs Evandro Barbosa e Supi como fazer uma boa abertura no jogo de xadrez, e, isso, sinceramente, é algo gigantesco. Não precisei sair de casa, a mensalidade é muito menor do que deveria ser no ensino presencial. Sem falar que para ter aula diária com um GM Internacional, aqui em Itajaí – Santa Catarina, seria praticamente impossível. Mas, eu estou em Itajaí e tenho aulas diárias com diversos GMs e devo isso ao uso das tecnologias da Era Digital. Ficou muito mais fácil e barato estudar. O conhecimento está disponível em diversas plataformas – algumas pagas, outras gratuitas – e os obstáculos para a aprendizagem estão praticamente se dissolvendo no ar. Principalmente agora, no Brasil, que todos os cidadãos possuem celular – isso ocorreu com a implantação do PIX e a transferência para a plataforma digital do pagamento de ‘bolsas sociais’ por parte do Governo Federal, a partir do ano de 2020, fazendo sumir o dinheiro físico.

Depois, de estudar na plataforma ‘Chessflix’ eu posso acessar a plataforma ‘Lichess’  e jogar partidas de xadrez com pessoas do mundo inteiro. O computador escolhe o meu adversário de acordo com o meu próprio ‘rating’. Contudo, se preferir, e prefiro, dá de se especializar na resolução de ‘problemas’ ou ‘quebra-cabeças’ … uma forma muito interessante de exercitar sua mente diariamente. Isso tudo gratuitamente. Querer mais o quê?

Novas e velhas palavras

Lendo o livro do memorialista Juventino Linhares ‘O que a memória guardou’ fiquei observando as palavras que eram de uso comum até a década de 1960 e que foram caindo no desuso pela população em geral e, até mesmo, para os jornalistas. Entre estas palavras que ficaram velhas destaco: alcaide [prefeito], logradouro [rua, praça], lazareto [leprosário], nosocômio [hospital], carreira [raia de corrida], facultativo [pessoa formada em faculdade], botica [farmácia]., datilógrafo [digitador].

Mas, em compensação, a nossa vida é invadida por novas palavras diariamente. Principalmente com a Era Digital, foi necessária a criação de novos termos que dessem conta de atender a uma nova realidade. Cada nova tecnologia exige novas palavras. Como o uso de novas tecnologias passou a ter uma velocidade alucinante, as palavras correspondentes a cada uma também surgem em ritmo alucinante. CD, DVD, drone, pendrive, HD externa, bluetooth …. são novos termos para novas tecnologias. Mas temos também palavras antigas que mudam de sentido para poder dar conta de denominar uma nova tecnologia. É o caso, de ‘celular’ e ‘satélite’.

Não faz muito tempo nós incorporamos o termo ‘fake news’ no nosso novíssimo vocabulário para expressar a ideia de que uma informação era falsa. Não bastava a palavra ‘mentira’ ou o termo composto ‘notícia falsa’. De uns tempos para cá deram para invadir nosso cotidiano termos com ‘voucher’ e ‘cachbak’. Todas as propagandas acabam utilizando esses termos para tentar ‘fidelizar’ os clientes a uma determinada marca. Agora, durante o processo eleitoral de 2024, emerge dos labirintos da política partidária uma tal de ‘deepfake’. Segundo consta, seria o uso de Inteligência Artificial para manipular a imagem e/ou a voz de uma pessoa, fazendo com que ela pareça dizer ou fazer algo que comprovadamente não fez. Manipulação de imagem com qualidade de realidade.

A língua oficial da Era da Inteligência Artificial é a língua inglesa. Disso ninguém tem dúvida.  Cada tempo tem sua língua oficial impregnando as demais línguas mundo afora. No tempo de Machado de Assis era comum introduzir termos franceses no texto. No tempo de Padre Antônio Vieira era impossível ser um grande orador sem intercalar no texto algumas máximas latinas. Nisso o Brasil tem um grande prejuízo, porque abriga gerações sucessivas de pessoas que falam apenas uma língua, sendo que a maioria sequer a domina de forma razoável. Encontrar uma pessoa bilingue no Brasil é mais raro do que encontrar pessoas que dominam mais de três línguas na Europa. Isso se deve à nossa realidade colonial de criar o ‘espírito nacional’ e o conceito de ‘pátria’ entre nosso próprio povo. [Magru Floriano]

Duvido, logo penso!

Estamos adentrando uma nova era na história da humanidade. Estamos diante da realização de tudo o que a ficção científica sempre nos apresentou como uma distopia futura. A máquina está conquistando seus ares de humanidade e ganhando a capacidade de pensar como um ser humano.

O primeiro sinal sobre a derrubada das fronteiras entre máquina e ser humano foi dada no ano de 1996 quando o computador da IBM – com o sugestivo nome de Deep Blue [azul profundo] – venceu uma partida de xadrez do insuperável Garry Kasparov. Fez mais, no ano seguinte, atualizado, venceu o match contra Kasparov, selando por definitivo a quebra das fronteiras entre inteligência natural e inteligência artificial. Estava dada a largada para o estabelecimento da Era da Inteligência Artificial.

Agora, em pleno ano de 2024, vejo uma foto de autoria do francês Jerome Brouillet onde o surfista brasileiro Gabriel Medina paira no ar ao lado de sua prancha sobre uma gigantesca onda do mar do Taiti – praia de Teahupoo – onde estavam sendo realizadas as provas de surf das Olimpíadas de Paris. Ao ver a foto fiquei na dúvida sobre sua veracidade. Depois, pesquisando na Internet tive a confirmação de se tratar de foto verdadeira. O fato retratado na foto é verdadeiro.

Desta minha dúvida inicial me adveio um questionamento sobre a minha própria postura diante da mídia atual. Devido ao uso exagerado de ‘fake news’ durante as campanhas eleitorais e, também, nas redes sociais em todos os tempos, comecei a perceber que a minha tendência inicial é sempre duvidar de fotos, vídeos e textos noticiosos cujos conteúdos sejam considerados ‘poucos prováveis’. Foi assim, por exemplo, quando vi uma foto do governador de Santa Catarina com as mãos apoiadas nas nádegas da esposa de um ex-presidente. Comecei a perceber que, dia após dia, cada vez mais fiquei propenso a duvidar das imagens por conta do grande número de manipulações que estão sendo feitas mundo afora.

A coisa ficou tão séria que os grandes conglomerados de notícias resolveram criar serviços especiais para garantir que tal informação ‘não é fake news’ ou, ao contrário, alertar seu leitor de que se trata de ‘fake news’. Neste ano eleitoral de 2024, parece que o uso da IA – Inteligência Artificial – para manipular fotografias e até mesmo modificar o discurso de um político vai dar o tom de muitas campanhas Brasil afora.

Na Era da Inteligência Artificial, portanto, a primeira vítima é o consumidor de informação. Este terá, sempre, de duvidar. Terá de criar um mecanismo próximo da ‘dúvida sistemática’ de Renée Descarts.  No mundo atual a máxima será “Duvido, logo penso !” [Magru Floriano].

Apagão cibernético global

A ficção científica sempre nos apresentou distopias as mais dramáticas possíveis. Na Era Digital a distopia mais corriqueira é aquela que apresenta um mundo em colapso devido a uma pane geral no sistema de computação ou o controle deste mesmo sistema por um robô que ‘traiu’ o seu criador. Pensar em um apagão geral é realmente um pesadelo, porque nos dias atuais tudo, absolutamente tudo, está ligado à rede global dos satélites e computadores. Sem ela não funciona de aeroporto a semáforo na esquina da nossa casa.

Bem, acontece que no dia 29 de julho de 2004 a humanidade teve uma pequena mostra de que esta distopia, até então prevista apenas nas peças de ficção científica, é algo possível de acontecer. A imprensa chamou o fenômeno de ‘Apagão internacional’, ‘Pane global’, ‘Apagão cibernético global’, e, poeticamente, de ‘apagão azul da morte’.  A referência à cor azul deu-se pelo fato de que os telões dos aeroportos ficaram todos azuis, sem qualquer dado para apresentar aos passageiros que esperam sua hora do embarque.

A pane do sistema ocorreu por conta de uma atualização mal-sucedida no sistema de uma empresa privada nos Estados Undios de nome Crowd Strike. Uma desconhecida dos bilhões de mortais que costumam levar suas vidas sem se importarem com o mercado de ações nas bolsas de valores mundiais. Mas, a invisível Crowd Strike promoveu uma ‘espiral de telas azuis’ pelo mundo inteiro, parando por completo aeroportos, portos e até bancos no Brasil. [Magru Floriano]

Adeus ao Dinheiro

Ninguém tem mais dúvida de que o dinheiro vivo – em cédula e moeda – vai deixar de circular ainda nesta década. Chegaremos em 2030 sem dinheiro no bolso. Essa tendência que, à primeira vista, parecia ser de longo prazo, passou a ser uma tendência de médio prazo a partir da pandemia do Covid e a criação do PIX, no ano de 2020.

Neste ano, as pessoas das classes mais abastadas e escolarizadas já tinham decidido deixar o dinheiro físico de lado em troca das comodidades do dinheiro eletrônico – à mão do usuário através de cartões magnéticos e aplicativos de aparelhos celulares. Mas, em novembro o Banco Central do Brasil lançou o PIX e incluiu no sistema financeiro nacional quase 72 milhões de usuários. O Governo Federal colocou todos os assistidos com programas sociais do Estado no sistema eletrônico, levando esse enorme contingente de cidadãos invisíveis ao sistema bancário nacional a terem acesso a um celular e uma conta bancária digital. Agora, as classes menos favorecidas recebiam seus auxílios governamentais com dinheiro eletrônico.

Como eu gosto muito de fazer experiências nesse setor que envolve mudança social através do implemento de novas tecnologias, resolvi todo mês pegar uma quantia de dinheiro físico no banco e tentar pagar contas com cédulas e moedas. No início, ainda em 2021, tinha dificuldade de pagar contas em padarias e supermercados com notas mais altas, duzentos e cem reais. Mas a partir de 2022 comecei a perceber a dificuldade em pagar com presteza qualquer conta independente de valor. A dificuldade maior ocorrida quando da necessidade de moedas. A primeira moeda que sumiu por completo dos caixas foram as pequeninas moedas de um centavo. Depois, sumiram as moedas de cinco centavos. Por último, sumiram todas as moedas.

O sumiço das moedas era o prenúncio de uma tendência irreversível. Agora, em pleno ano de 2024, quando puxo a carteira e apresento dinheiro físico alguns caixas demonstram espanto e até certa irritabilidade, porque sabem que vão ter problemas para arrumar o troco correto para me entregar. Nos supermercados é comum o caixa apertar o botão da luz vermelha para chamar o assistente de caixa, para poder trocar notas maiores por notas menores e até conseguir algumas preciosas moedas. Nos restaurantes tornou-se usual os caixas arredondarem as contas, para fugir ao supremo sacrifício de conseguir notas de baixo valor e moedas. A partir deste ano, não lembro uma vez que tenha apresentado uma nota de cem reais a um comerciante que não tenha de perder mais tempo do que um usuário de cartão. Geralmente um caixa acode ao outro ou uma pessoa de apoio é acionada, como os tradicionais assistentes de caixas e até os gerentes.

O caso mais extremo que vivenciei este ano ocorreu na Drogaria Catarinense. Fui fazer uma compra na loja da Rua Hercílio Luz e ao apresentar o dinheiro físico o caixa simplesmente me comunicou que não tinha como me dar o troco e desfez o registro da minha compra. Insisti, dizendo que tinha o direito de pagar com dinheiro de circulação nacional e ele simplesmente disse-me: ‘Hoje é domingo, não tenho como conseguir o troco para lhe dar”. Encerrada a conversa, sai sem a mercadoria apesar de ter o dinheiro para compra-la. No mês de agosto, em duas oportunidades fiquei devendo no caixa do restaurante onde almoço com regularidade. Motivo: “não temos troco, fica no fiado”.

Então é isso, quem deseja se incomodar no comércio que utilize dinheiro físico para pagar suas contas. Por enquanto ainda estão aceitando os cartões magnéticos. Acontece que as maquinazinhas de cartões também estão com seus dias contados. Tenho notado uma certa tendência entre os integrantes das classes mais abastadas e escolarizadas a utilizarem o celular pelo sistema de aproximação para pagar todas as contas. Nem dinheiro, nem cartão magnético, teremos apenas dinheiro eletrônico acessado através do celular.

Adeus dinheiro. Quando alguém quiser ver uma raridade dessas que procure um colecionador. Isso já havia acontecido com outras peças que passaram a ser consideradas peças históricas, como é o caso do selo, ficha telefônica e o belíssimo cartão postal. [Magru Floriano – 2024].

O futuro da imprensa

O futuro da imprensa é não ter imprensa. Isto se levarmos em conta que o termo imprensa remete diretamente à atividade de impressão. Não teremos mais jornais/revistas impressos. Mas, não é só isso. Não teremos também jornalismo enquanto atividade profissional remunerada. Teremos comentaristas, apresentadores e animadores de programas em rádio e TV, comentaristas e colunistas nos jornais digitais e nas múltiplas plataformas ocupadas pelas redes sociais na Internet. Atualmente [2024] estima-se que noventa por cento dos jornalistas graduados pelas universidades catarinenses esteja trabalhando no setor de assessoria de imprensa e produção própria de conteúdo digital.

Jornalistas Gracie e Ivan Rupp no ateliê de Magru Floriano – 2024.

Entre os anos de 1970 e 2000 o normal seria que o jornalista tivesse emprego prioritário em um órgão de imprensa [rádio, TV, jornal, site de notícia] e, fizesse ‘bico’ em assessorias ocasionais.  Nos dias atuais [2024] a pirâmide ocupacional se inverteu e a assessoria de imprensa virou o principal mercado do jornalista. São elas que pautam todos os jornais – os que resistiram à concorrência com as mídias digitais – rádio e televisão.  

A imprensa está pautada por dois grandes focos produtores de informações: assessoria de imprensa e redes sociais digitais. O problema é que ambos os conteúdos produzidos por eles são tecnicamente medíocres. Enquanto a assessoria só vê o lado da empresa que trabalha, as redes sociais são condicionadas pelo mal do ‘achismo’ e da opinião sem qualificação técnica. O quadro fica ainda mais grave quando colocamos nas redações gente que não sabe escrever e repassa para a IA – Inteligência Artificial – a missão de elaborar o texto a partir de algumas informações coletadas apressadamente na Internet.

No dia 11 de janeiro de 2018 publiquei um texto com o título ‘Quem reclama? Do que reclama?’ na plataforma Facebook. Em 24 horas o material contava com 1.500 curtidas, 1.200 compartilhamentos, 500 comentários vindos de todas as regiões de Santa Catarina. No dia seguinte, o Diário do Litoral publicou um depoimento meu sobre o aniversário de 39 anos do jornal – já que fui um dos seus primeiros repórteres. Apenas uma pessoa me enviou mensagem comentando sobre minha participação na edição do jornal mais lido da cidade.

A pandemia do Covid simplesmente acelerou uma tendência que vinha se desenrolando por muito tempo e, tudo indicava, ainda ia demorar um tempo relativo para se completar. O tempo histórico foi acelerado na pandemia a partir de 2019. Por conta do auxílio do Governo Federal, por exemplo, todas as pessoas com baixa renda tiveram de abrir conta digital e indicar um número de celular, migrando compulsoriamente para o banco digital e seus produtos revolucionários não presenciais, como é o caso de ‘Aplicativo Bancário’ e o sistema de pagamento ‘Pix’. A totalidade da sociedade brasileira foi incorporada à era digital … o resto é história.

Tendo um celular em mãos conectado à Internet por que motivos a população iria esperar até o dia seguinte para ler as notícias em um jornal impresso? Principalmente a plataforma WhattsApp, ao formar grupos de interesses, conecta a pessoa ao mundo real instantâneo. Um acidente na BR-101 é filmado/fotografado e no mesmo instante transmitido por toda a rede na velocidade de segundos. O jornal tinha dois produtos que interessavam ao leitor: notícia e opinião. A notícia é veiculada instantaneamente pelos grupos digitais via WhattsApp, Instagran, Facebook …; a opinião é expressa à exaustão nas redes sociais. Sobrou o que para o jornal do dia seguinte?

Mas, calma, nunca está suficientemente ruim que não possa piorar um pouco mais. Devido ao quadro bipolarizado do cenário político brasileiro, as pessoas começaram a ter o péssimo hábito de desqualificar qualquer conteúdo jornalístico transmitido por determinado veículo de comunicação que não esteja alinhado ao seu grupo ideológico. A Rede Globo é uma das vítimas dessa realidade contaminada ideologicamente, mas está longe de ser a única. Junto a esta escolha pelo órgão de imprensa alinhado ideologicamente vem a tendência de aceitar com muita naturalidade ‘fake news’, desde que a mesma esteja de acordo com suas ideias e interesses ideológicos.

Temos um cenário de tempestade perfeita: fake news, escolha ideológica da fonte de notícia, manipulação de imagens por mecanismos de IA – Inteligência Artificial, fim do jornalismo de múltiplas fontes … tudo isso leva à ascensão e hegemonia do idiota como o comunicador de sucesso. O especialista, o técnico, aquele que estudou durante décadas um determinado assunto, tem de disputar vorazmente com o idiota seu espaço de opinião nas plataformas digitais. No mundo digital todo mundo é doutor de tudo. Ler e estudar deixa-se para depois, porque o agora exige que se lance a opinião para conquistar seguidores.

CIDADE DE CIMENTO

Magru Floriano

Itajaí está correndo um sério risco de se tornar mais uma cidade de cimento, como já vem ocorrendo com as cidades de Balneário Camboriú e Itapema. A facilidade como a Prefeitura decreta a derruba de árvores é espantosa e causa extrema preocupação a qualquer pessoa com um mínimo de bom senso. Não bastasse ter transformado a Rua Hercílio Luz em uma rampa de concreto-armado, a municipalidade colocou vasos de bonsais aqui e ali para disfarçar, aparentando ter algum verde em toda a sua extensão. Bem poderíamos denominar a principal rua da cidade de RUA DOS BONSAIS… porque o resto é cimento. Agora, anuncia uma reforma geral na Avenida Marcos Konder, retirando dela quase uma centena de árvores. Uma obra, diga-se, a bem da verdade, completamente desnecessária. Dinheiro público que poderia ser utilizado em obras muito mais úteis e socialmente desejáveis na periferia da cidade.

Rua Hercílio Luz passou a ser uma rampa de concreto-armado … sem vida.

Itajaí tem um histórico na questão ecológica que nos preocupa. As árvores sempre foram derrubadas sem o menor pudor. Quem lê um pouco sobre os tempos de antanho não terá muita dificuldade em detectar diversas ocasiões em que as árvores foram derrubadas em nome do progresso, não tendo a devida compensação ecológica. Foi assim nas diversas reformas ocorridas na Praça Vidal Ramos no tempo que Irineu Bornhausen era o prefeito e, foi assim também, com a Avenida Joca Brandão e rua José Eugênio Müller – na Vila Operária. A Avenida Joca Brandão e a Rodovia Osvaldo Reis perderam árvores e plantas para dar lugar às palmeiras, árvores sem sombras que cumprem apenas designíos estéticos. Está viva na minha memória a derrubada das figueiras para dar lugar ao Terminal de Ônibus da Fazenda …. 

O pior de tudo é perceber que a Prefeitura, o poder público, é o péssimo exemplo a ser seguido pela iniciativa privada. Ela derruba árvores frondosas e planta palmeiras ou bonsais, promove terraplanagem e terraplenagem em locais como o Saco da Fazenda, canaliza o Ribeirão da Caetana e autoriza construção sobre o mesmo, não tem uma política definida para preservar áreas com nascentes para captação de água potável, não olha com atenção a ocupação das margens dos rios e ribeirões, legaliza loteamentos feitos em grandes áreas de margem de rio e baixios antes utilizados na plantação de arroz irrigado, colocando a vida e o patrimônio de milhares de pessoas em risco constante, como é o caso dos loteamentos Santa Regina e Portal…..

Temo em dizer, dado o histórico aqui levantado de memória, que as centenas de árvores da Avenida Marcos Konder não serão as últimas a serem derrubas na cidade. O cimento e o asfalto tomarão conta de tudo e, depois… bem, depois, vem o choro e a lágrima, com a natureza simplesmente querendo sua parte de volta. Já que não aprendemos nada com as enchentes de 1983 e 2008, será que temos capacidade de aprender com o que está acontecendo no Rio Grande do Sul?

CHEGA DE CIMENTO E BONSAIS. QUEREMOS ÁRVORES!